quinta-feira, 25 de setembro de 2014

Gabriela o beija-flor do cerrado


Quem é que vê além da linha uma vogal colorida
Com seu sabor para amaciar os olhos?
Sim, é ela a chegar dos Montes – Gabriela.
Com sua flor entre os cabelos era nomeada.
Enriquecida de vésperas e desvisões
Nos Gerais de sua saia rodada
Gabriela deambulava nas labaredas de Minas
A catar fruta da terra
Da raiz que desfolha a polpa
Costura o tempo,
Com a sede de suas folhas
Dedilha na janela seu indivisível beijo,
Múltiplo, avulso;
Bebido de mar e onda,
Sobre a fonte que recostas as promessas
Às fitas presas aos fios negros
Apascenta os alecrins.

E dar-me sempre divisas de Caatingas e seixos
Contornos aos cílios,
Que dão-te delicadeza à pele,
Ao rubro do pincel que desenha tua boca.
Mas habitas veemente entre as lascas das Montanhas
A dar-me teu colo nas pontas das curvas,
E desliza a amplidão para dar leveza aos meus pés.
Convida-me vestida de infinito,
Para sentar-me na grama salpicada de cores e milagres
No assoalho de um tecido bordado à mão;
E alimenta-me de sóis e dá alegrias aos passeios.
A fecundar com pão-de-queijo e mel.

E floresce moldurada
Para destoar na voz dos lilases de pássaros
Os versos de um canto-azul,
Asas em uma orquídea;
Pertença a latitudes
Por ter em si o perfume dos sons;
Textura dos ladrilhos,
Pétala aérea sob a casca
Teu nome na caixa do lápis de cor.

Reconheces que não há espanto?
Em fazer-te cenário maiúsculo a esse?
És coberta de rios
Descoberta para fitar a palavra do papel
Refazer a casa, o caminho, namorar o amanhecer.
Para endireitar-me para além do apreensível.
Chegas assim, revelada para a beleza:
Quem é que vê além da linha uma vogal colorida
Com seu sabor para amaciar os olhos?
Sim, é ela
Gabriela o beija-flor do cerrado.

(Fernanda Fraga)