Aos 7 anos, menina míope com letras miúdas, irregulares;
a escrever uma lição de casa da escola para professora Tia Raquel,
ela escolhia trechos das poesias de Manoel de Barros para desenrolar nosso
letrado.
Eu treinava religiosamente minha grafia, fazia o ditado e transcrevia os
versos do menino azul, do menino que carregava água com a peneira, do menino
que namorava as cores das palavras e ouvia/sentia o perfume do sol. Ele dizia:
“deixei uma ave me amanhecer”, “Aprendera no Circo/há idos/que a palavra tem
que chegar ao grau de brinquedo/Para ser séria de rir”.
E eu pequena perguntava aquela gente maior que a mim:
- Como ele escreve isso?
Como a gente escreve verso tia?
Eu só sei desenhar o sol com o cheiro que ele sente, a senhora sente?
Como é?
Eu indagava em casa, será esse cheiro aveludado da minha blusa,
o silêncio com gosto de jabuticaba que eu sinto quando a tia ler pra
mim?
Será esse barulho que escuto quando a letra encontra com a vogal ‘a’,
junto as abelhinhas daqui do quintal? Como saber?
Aliás, a gente depois de grande sempre soube da tal sensibilidade nos
faz alcançar as proximidades desses voos da infância e silêncios tão juntos aos
dele. Naquela tarde eu transcrevia o primeiro verso do Manoelito, com minhas
mãos pequenas, em um papel de pão, lá da padaria do seu João Vieira: “Os
andarilhos, as crianças e os passarinhos têm o dom de ser poesia”. Posso dizer
que foi aos sete anos com as minhas primeiras letras, a escrever as palavras
dele.
(Fernanda Fraga)
*O coração dele pulsou a
verdadeira imensidão poética até o último segundo, mesmo quieto, mesmo sem
escrever, mesmo sem forças. Hoje é o céu que abraça a sua amplidão olhe-vos!
Contemplem-no em continuidade!! Vai em paz, poeta!!
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